sábado, 28 de janeiro de 2012
quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
domingo, 22 de janeiro de 2012
sábado, 21 de janeiro de 2012
Romantismo
QQuem tivesse um amor, nesta noite de lua,
para pensar um belo pensamentoe pousá-lo no vento!...
Quem tivesse um amor - longe, certo e impossível -
para se ver chorando, e gostar de chorar,
e adormecer de lágrimas e luar!
Quem tivesse um amor, e, entre o mar e as estrelas,
partisse por nuvens, dormente e acordado,
levitando apenas, pelo amor levado...
Quem tivesse um amor, sem dúvida nem mácula,
sem antes nem depois: verdade e alegoria...
Ah! Quem tivesse... (Mas quem tem? Quem teria?)
Cecília Meireles
sábado, 14 de janeiro de 2012
APRENDO PORQUE AMO
Recordo a Adélia Prado: "Não
quero faca nem queijo; quero é fome". Se estou com fome e gosto de queijo,
eu como queijo... Mas e se eu não gostar de queijo? Procuro outra coisa de que
goste: banana, pão com manteiga, chocolate... Mas as coisas mudam de figura se
minha namorada for mineira, gostar de queijo e for da opinião que gostar de
queijo é uma questão de caráter. Aí, por amor à minha namorada, eu trato de
aprender a gostar de queijo.
Lembro-me do filme
"Assédio", de Bernardo Bertolucci. A história se passa numa cidade do
norte da Itália ou da Suíça. Um pianista vivia sozinho numa casa imensa que
havia recebido como herança. Ele não conseguia cuidar da casa sozinho nem tinha
dinheiro para pagar uma faxineira. Aí ele propôs uma troca: ofereceu moradia para
quem se dispusesse a fazer os serviços de limpeza.
Apresentou-se uma jovem negra,
recém-vinda da África, estudante de medicina. Linda! A jovem fazia medicina
ocidental com a cabeça, mas o seu coração estava na música da sua terra, os
atabaques, o ritmo, a dança. Enquanto varria e limpava, sofria ouvindo o
pianista tocando uma música horrível: Bach, Brahms, Debussy... Aconteceu que o
pianista se apaixonou por ela. Mas ela não quis saber de namoro. Achou que se
tratava de assédio sexual e despachou o pianista falando sobre o horror da
música que ele tocava.
O pobre pianista, humilhado,
recolheu-se à sua desilusão, mas uma grande transformação aconteceu: ele
começou a frequentar os lugares onde se tocava música africana. Até que aquela
música diferente entrou no seu corpo e deslizou para os seus dedos. De repente,
a jovem de vassoura na mão começou a ouvir uma música diferente, música que
mexia com o seu corpo e suas memórias... E foi assim que se iniciou uma estória
de amor atravessado: ele, por causa do seu amor pela jovem, aprendendo a amar
uma música de que nunca gostara, e a jovem, por causa do seu amor pela música
africana, aprendendo a amar o pianista que não amara. Sabedoria da psicanálise:
frequentemente, a gente aprende a gostar de queijo por meio do amor pela namorada
que gosta de queijo...
Isso me remete a uma inesquecível
experiência infantil. Eu estava no primeiro ano do grupo. A professora era a
dona Clotilde. Ela fazia o seguinte: sentava-se numa cadeira bem no meio da
sala, num lugar onde todos a viam —acho que fazia de propósito, por maldade—,
desabotoava a blusa até o estômago, enfiava a mão dentro dela e puxava para
fora um seio lindo, liso, branco, aquele mamilo atrevido... E nós, meninos, de
boca aberta... Mas isso durava não mais que cinco segundos, porque ela logo
pegava o nenezinho e o punha para mamar. E lá ficávamos nós, sentindo coisas
estranhas que não entendíamos: o corpo sabe coisas que a cabeça não sabe.
Terminada a aula, os meninos
faziam fila junto à dona Clotilde, pedindo para carregar sua pasta. Quem
recebia a pasta era um felizardo, invejado. Como diz o velho ditado, "quem
não tem seio carrega pasta"... Mas tem mais: o pai da dona Clotilde era
dono de um botequim onde se vendia um doce chamado "mata-fome", de
que nunca gostei. Mas eu comprava um mata-fome e ia para casa comendo o
mata-fome bem devagarzinho... Poeticamente, trata-se de uma metonímia: o
"mata-fome" era o seio da dona Clotilde...
Ridendo dicere severum: rindo,
dizer as coisas sérias... Pois rindo estou dizendo que frequentemente se
aprende uma coisa de que não se gosta por se gostar da pessoa que a ensina. E
isso porque —lição da psicanálise e da poesia— o amor faz a magia de ligar
coisas separadas, até mesmo contraditórias. Pois a gente não guarda e agrada uma
coisa que pertenceu à pessoa amada? Mas a "coisa" não é a pessoa
amada! "É sim!", dizem poesia, psicanálise e magia: a
"coisa" ficou contagiada com a aura da pessoa amada.
Minha avó guardava uns bichinhos
que haviam pertencido a um filho que morrera. Guardo um peso de papel, de
vidro, que pertenceu ao meu pai. E os apaixonados guardam uma peça de roupa da
pessoa amada e a colocam sobre o travesseiro, ao dormir... Mesmo depois de ela
ter morrido. É como se, por meio daquela "coisa" que não é a pessoa
amada, fosse possível tocar e acariciar a pessoa amada, ausente.
Pois o mesmo mecanismo acontece
na educação. Quando se admira um mestre, o coração dá ordens à inteligência
para aprender as coisas que o mestre sabe. Saber o que ele sabe passa a ser uma
forma de estar com ele. Aprendo porque amo, aprendo porque admiro. Sabendo o
que ele sabe eu carrego a sua pasta, como o "mata-fome", faço amor
com ele.
Lamento dizer isso: tive poucos
mestres que admirasse. Lembro-me de um que admiro até hoje, embora já se tenham
passado mais de 50 anos: Leônidas Sobrinho Porto. Professor de literatura,
nunca nos atormentou com informações sobre nomes e escolas literárias. Ele
sabia que não aprenderíamos. Mas quando ele se punha a falar, era como se
estivesse possuído. Falava com tal paixão sobre as grandes obras literárias que
era impossível não ser contagiado. Eu o admirava porque nele brilhava a beleza
da literatura, "queijo" de que eu não gostava. Ele me fez amar a
literatura.
A dona Clotilde nos dá a lição de
pedagogia: quem deseja o seio, mas não pode prová-lo, realiza o seu amor
poeticamente, por metonímia: carrega a pasta e come "mata-fome"...
Rubem Alves
quinta-feira, 12 de janeiro de 2012
Eu desejo que desejes
Eu desejo que desejes ser feliz de um modo possível e rápido,
desejo que desejes uma via expressa rumo a realizações não utópicas,
mas viáveis, que desejes coisas simples como um suco gelado
depois de correr ou um abraço ao chegar em casa,
desejo que desejes com discernimento e com alvos bem mirados.
desejo que desejes uma via expressa rumo a realizações não utópicas,
mas viáveis, que desejes coisas simples como um suco gelado
depois de correr ou um abraço ao chegar em casa,
desejo que desejes com discernimento e com alvos bem mirados.
Mas desejo também que desejes com audácia,
que desejes uns sonhos descabidos
e que ao sabê-los impossíveis não os leve em grande consideração,
mas os mantenha acesos, livres de frustração,
desejes com fantasia e atrevimento,
estando alerta para as casualidades e os milagres,
para o imponderável da vida, onde os desejos secretos são atendidos.
que desejes uns sonhos descabidos
e que ao sabê-los impossíveis não os leve em grande consideração,
mas os mantenha acesos, livres de frustração,
desejes com fantasia e atrevimento,
estando alerta para as casualidades e os milagres,
para o imponderável da vida, onde os desejos secretos são atendidos.
Desejo que desejes trabalhar melhor, que desejes amar com menos amarras,
que desejes parar de fumar, que desejes viajar para bem longe
e desejes voltar para teu canto, desejo que desejes crescer
e que desejes o choro e o silêncio, através deles somos puxados pra dentro,
eu desejo que desejes ter a coragem de se enxergar mais nitidamente.
que desejes parar de fumar, que desejes viajar para bem longe
e desejes voltar para teu canto, desejo que desejes crescer
e que desejes o choro e o silêncio, através deles somos puxados pra dentro,
eu desejo que desejes ter a coragem de se enxergar mais nitidamente.
Mas desejo também que desejes uma alegria incontida,
que desejes mais amigos, e nem precisam ser melhores amigos,
basta que sejam bons parceiros de esporte e de mesas de bar,
que desejes o bar tanto quanto a igreja,
mas que o desejo pelo encontro seja sincero,
que desejes escutar as histórias dos outros,
que desejes acreditar nelas e desacreditar também,
faz parte este ir-e-vir de certezas e incertezas,
que desejes não ter tantos desejos concretos,
que o desejo maior seja a convivência pacífica
com outros que desejam outras coisas.
que desejes mais amigos, e nem precisam ser melhores amigos,
basta que sejam bons parceiros de esporte e de mesas de bar,
que desejes o bar tanto quanto a igreja,
mas que o desejo pelo encontro seja sincero,
que desejes escutar as histórias dos outros,
que desejes acreditar nelas e desacreditar também,
faz parte este ir-e-vir de certezas e incertezas,
que desejes não ter tantos desejos concretos,
que o desejo maior seja a convivência pacífica
com outros que desejam outras coisas.
Desejo que desejes alguma mudança,
uma mudança que seja necessária e que ela não te pese na alma,
mudanças são temidas, mas não há outro combustível para essa travessia.
Desejo que desejes um ano inteiro de muitos meses bem fechados,
que nada fique por fazer, e desejo, principalmente,
que desejes desejar, que te permitas desejar,
pois o desejo é vigoroso e gratuito, o desejo é inocente,
não reprima teus pedidos ocultos, desejo que desejes vitórias,
romances, diagnósticos favoráveis, mais dinheiro e sentimentos vários,
mas desejo, antes de tudo, que desejes, simplesmente.
uma mudança que seja necessária e que ela não te pese na alma,
mudanças são temidas, mas não há outro combustível para essa travessia.
Desejo que desejes um ano inteiro de muitos meses bem fechados,
que nada fique por fazer, e desejo, principalmente,
que desejes desejar, que te permitas desejar,
pois o desejo é vigoroso e gratuito, o desejo é inocente,
não reprima teus pedidos ocultos, desejo que desejes vitórias,
romances, diagnósticos favoráveis, mais dinheiro e sentimentos vários,
mas desejo, antes de tudo, que desejes, simplesmente.
Martha Medeiros
quarta-feira, 11 de janeiro de 2012
terça-feira, 3 de janeiro de 2012
segunda-feira, 2 de janeiro de 2012
Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.
Cecília Meireles
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